Lua Rosa?
Astronomia é uma ciência fascinante e atraente. Entretanto, um descuido pode levar pessoas e pessoas ao engano. Por exemplo, desde segunda-feira, o meu telemóvel não tem parado. Em pauta, as pessoas perguntaram-me sobre uma tal “Lua Rosa”.
Com tantas pessoas a perguntarem, achei válido escrever sobre esse tema. Vamos lá?
Para começo de conversa: existe isso? Isso procede? Resposta para ambas indagações: não. Se não existe, por qual motivo as pessoas estão a falar sobre isso na internet e redes sociais? Resposta: “Há pessoas que acreditam que tais actitudes ajudam a divulgar a Astronomia e a Ciência”. Particularmente, eu não penso assim. Astronomia não é modismo, é uma Ciência e como tal vive de factos. Se o facto não ocorre, simplesmente não existe para nós.
Alto lá! E o que diz a lenda? Há várias versões, bem diferentes por sinal. Vamos citar a menos incoerente, ok? O texto afirma que “No dia 11 de abril, chegará ao céu a Lua Rosa. Conforme aconteceu em 1957, quando a Lua estava acompanhada por Marte e Saturno. Naquela época, o fenómeno ficou conhecido como “Verão do amor”, o que estava a ser associado ao movimento Hippie”.
Vamos analisar o trecho acima? Primeiramente, o que há de especial no dia 11 de abril daquele ano? O nome “Lua cor-de-rosa” é como algumas culturas do hemisfério norte (como por exemplo: Canadá e Estados Unidos) denominam à primeira lua cheia do mês de abril, mês no qual as flores cor-de-rosa florescem (isso se dá na primavera deles). Mas, por favor: NÃO ESPERE QUE A LUA FIQUE COR-DE-ROSA!
Sim, hoje é dia 11 de abril e a Lua estará na fase cheia. Também hoje será a primeira e única Lua cheia de abril. Ah, entendi, quer dizer que tudo o que foi dito nas redes sociais era verdade? Definitivamente: não! Para clarear o assunto, vejamos como estava o céu de Parintins a 11 de abril de 1957 (para quem tem mais de 60 anos de idade, talvez irá se lembrar, ok?).
Você obervou bem o céu da noite de 11 de abril de 1957? Porventura a Lua não está acompanhada de Marte, Júpiter e Úrano? Aqui fica nítido o erro gravíssimo da mensagem que circulou nas redes sociais, a qual afirmou categoricamente que a Lua estaria acompanhada de Saturno. Outras falhas: você notou que o texto das redes sociais (que está em itálico acima) usa a expressão “verão”? Acontece que no hemisfério norte, neste mês, é primavera! E não verão. Outra cousa, as flores florecem na primavera, você notou? Mais um detalhe: a primavera no hemisfório norte começou em 20 de março e não em abril, ok?
Outro detalhe, o texto que circulou nas redes sociais afirma que “…esse fenómeno foi associado ao movimento Hippie.” – estranho, pois, conversei com um professor de História, brasileiro, e ele me afirmou que o movimento Hippie iniciou no começo dos anos 60. Neste caso, minha opinião é que o fenómeno astronómico aconteceu nos anos 50, portanto, antes do movimento Hippie. Mas se você for uma pessoa flexível e entender que haja alguma ligação entre o fenómeno astronómico e o movimento Hippie, então, vamos mais adiante nesta questão? O lema do movimento Hippie era “Paz e Amor”, muito bom! Mas na figura 02, a Lua está acompanhada de Marte (deus da guerra) e de Saturno (segundo a mitologia romana: com uma foice Saturno mutilou seu pai). Acho que não tem nada de “paz e amor” aqui não, você acha?
Para colocar um fim nesta estória, há versões nas redes sociais que citam os anos de 2017 e a próxima Lua Rosa em 2062. Acontece que em 11 de abril de 2062, não teremos Lua cheia. E quanto ao céu de hoje à noite, vejamos quem acompanhará a Lua?
Como se nota na figura 03, a Lua estará acompanhada por Júpiter e Saturno. Desta forma, o fenómeno de logo mais, ao anoitecer, não reproduz o fenómeno de 1957.
Eu acho legal quando as pessoas chegam até mim e passam a contar estórias e estórias. Porém, temos que ter o cuidado com a procedência, ok? Boa observação para si (se o tempo permitir, é claro!).
Dr. Nélio Sasaki – Doutor em Astrofísica, Líder do NEPA/UEA/CNPq, Membro da SAB, Membro da ABP, Membro da SBPC, Membro da SBF, membro da UAI, membro da PLOAD/Brasil e ST/Brasil, Revisor da Revista Areté, Revisor da Revista Eletrônica IODA, Revisor ad hoc do PCE/FAPEAM, Director do Planetário Digital de Parintins-NEPA/UEA/CNPq, Director do Planetário Digital de Manaus-NEPA/UEA/CNPq, Professor Adjunto da Universidade do Estado do Amazonas (UEA).