KELT-9b
Em geral, muitos perguntam-me: qual é a temperatura do planeta mais quente já encontrado por nós? Antes de responder à essa indagação, é meu dever lembrar-vos que um número significativo de pessoas acreditavam em uma relação directa entre a temperatura do astro e sua classificação (seja estrela, seja planeta). Para quem pensava assim, sinto-muito, mas não é bem assim. Por mais que a informação esteja na contramão do senso comum, faz-se necessária a reflexão sobre qual a definição de planeta e qual a definição de estrela. Essas definições ficam a cargo da União Astronómica Internacional (UAI).
Alto lá, estás a dizer que um planeta pode apresentar uma temperatura mais elevada que a de uma estrela? Pois foi exactamente isso que uma equipa de astrónomos descobriu. Estamos a falar de KELT-9b , um planeta do sistema estelar KELT-9.
Ao longo dos dias, a temperatura na superfície do exoplaneta ultrapassa facilmente a casa dos 4,3 mil graus Celsius, portanto, bem superior ao valor da temperatura de estrelas mais velhas e/ou frias. Também, para clarear este ponto, enfatizamos que a estrela-mãe KELT-9 é uma azul do tipo A – isso significa que sua temperatura é bem mais elevada que a temperatura do exoplaneta, sendo estimada em torno de 6,9 à 9,7 mil graus Celsius.
A elevada temperatura da estrela é apontada como a principal causa da ruína de KELT-9b. Isso porque o exoplaneta é um gigante gasoso. De sua categoria, ele é o planeta com temperatura mais elevada.
Se compararmos KELT-9b e Júpiter, notaremos que o exoplaneta possui quase o triplo da massa jupiteriana. Entretanto, o gigante gasoso do Sistema Solar é duas vezes mais denso que KELT-9b. Em princípio, surgiram questionamentos sobre o raio do exoplaneta. Muitos esperam que fosse menor do que o encontrado. Mas, estudos mostraram que a intensa radiação da estrela-mãe KELT-9 promoveu um “crescimento” anormal do raio planetário. Assim, com uma expansão positiva, abre margem para um novo cenário, a saber: O raio do exoplaneta poderá continuar a aumentar. E se isso acontacer, o KELT-9b será “destruído”. Haja vista que o processo de evaporação (neste caso) é irreversível.
Alguns desafios para a melhor compreensão desse exoplaneta: a parte do planeta que fica voltada para a estrela KELT-9, que denominaremos por “lado claro”, recebe intensa radiação. Logo, processos tais como formação de água, anidrido carbónico e metano são inviáveis. Não sabemos se tais substâncias são formadas ( mesmo que temporariamente) no lado escuro do planeta. E o mistério está apenas a começar. Certamente, a UAI deverá rever o conceito de planeta. Mesmo porque tal conceito aplica-se a KELT-9b devido às definições características de massa. Pois, certamente não o seria se analisássemos o comportamento da atmosfera do exoplaneta (particularmente da temperatura do lado claro), cujo padrão distoa completamente daquele apresentado por outros planetas.
Se compararmos a estrela KELT-9 e o Sol, a primeira pode ser considerada muito jovem – afinal, são 300 milhões de anos frente os 4,5 mil milhões de anos do Sol. Entretanto, KELT-9 tem mais que o dobro do tamanho do Sol e uma temperatura que chega a ser quase duas vezes a temperatura solar (aproximadamente 9,7 mil graus Celsius contra os singelos 5,5 mil graus Celsius do Sol).
O maior risco para o exoplaneta KELT-9b é justamente sua estrela-hospedeira. A relação entre ambos é muito energética e perigosa. Devido aos altos níveis de radiação que KELT-9 está a atacar o exoplaneta – é estimada a breve extinção do exoplaneta KELT-9b. Isso se considerarmos que a estrela permanecerá sempre do mesmo tamanho (facto que não se cumprirá).
Se observarmos as figuras 2 e 3, notaremos que KELT-9 é uma estrela azul. Isso significa que ela é muito, mas muito quente. Assim, espera-se que KELT-9 aumente de tamanho, ou seja, fique maior do que está. Com o aumento do seu raio, essa estrela irá se resfriar, paulatinamente tornar-se-á rubra. Resta ao exoplaneta KELT-9b duas possibilidades: ou sua evaporação completa, ou ficar à espera de ser literalmente engolido por sua estrela-mãe, que agora estará ainda maior. Só para sublinhar, KELT-9b é o primeiro planeta daquele sistema estelar.
Por fim, duas curiosidades sobre o exoplaneta KELT-9b, a saber: ele apresenta período orbital inferior a dois dias terrestres. Isso equivale a dizer que a cada 36h terrestres correspondem a um “ano” naquele exoplaneta. Segundo, KELT-9b está a girar perpendicularmente ao plano de rotação de sua estrela-mãe. Claro, para entendermos essas curiosidades e muito mais sobre o comportamento de KELT-9b, nós (astrónomos) estaremos a estudá-lo detalhadamente. Um bom momento para isso é o ano que está por vim, quando será aberta a temporada para a nova geração de telescópios.
Dr. Nélio Sasaki – Doutor em Astrofísica, Líder do NEPA/UEA/CNPq, Membro da SAB, Membro da ABP, Membro da SBPC, Membro da SBF, membro da UAI, membro da PLOAD/Brasil e ST/Brasil, Revisor da Revista Areté, Revisor da Revista Eletrônica IODA, Revisor ad hoc do PCE/FAPEAM, Director do Planetário Digital de Parintins-NEPA/UEA/CNPq, Director do Planetário Digital de Manaus-NEPA/UEA/CNPq, Professor Adjunto da Universidade do Estado do Amazonas (UEA).